sábado, 8 de agosto de 2015

Primeiro Ato

Estava a rodopiar por tuas lágrimas distantes, poeirentas, cor de musgo muito antigo.
E percebi num instante que elas tinham um odor violáceo, de algum tipo de flor ou música, como um grito numa caverna ancestral. 
O primitivo de teu lábio inferior era violento, inominável, coisa branca, substância macilenta.
Havia terra e ar que girava no ar de tuas botas, caminhas largo, depressa. Quase agressivo, quando formava uma semi-curva sensual, germinal, masculina na sombra de corpo.
Não era mais o forasteiro, não lutava mais a tua causa.
Algumas pessoas e formigas temiam-te, eu bem adivinhei. Sou boa fisionomista de corpos estelares.
Faltava-lhe água para o amor ou uma substância outra. Disso eu bem sabia.
Não há muito tempo. O sentido da vida era prático, dizias, julgavas. Medias ruas, terras, vidas.
Eu me encontrava perdida em redemoinhos, encruzilhadas, marcadas pela cor e pela tensão de teus olhos claros, alaranjados, quando floresciam numa manhã de junho. 
E eu caminhava. Tu, te calavas. 
Coração bom é coração que procura, disseram-me.
Procuravas manter a alma emudecida, feito bicho na toca, mas escutava-se o gemer mercurial de tuas garras, na fria caverna de templo intocado, sagrado. Tabu era teu nome, tabu era teu silêncio. Tabu era teu medo e tuas muralhas covardes.
Eu sangrei as mãos, crispei os dedos e gargalhei na velha linguagem ditada pela Lua vermelha.
Pois era maldita, pecaminosa, cheia de ígnea loucura, de ritos, de mistério e de caminhos assassinos. 
A mãe que sufoca sua prole enquanto dorme, essa era eu, dizias, julgavas. 
O tempo é repleto de covas, ossos, portanto, enterrei teus dois corvos às profundezas das raízes da árvore mítica. Há um sistema de signos e símbolos na morte plutoniana. Não a decifremos.
O cinza tinha a cor de meus cabelos, a neblina era teu sorriso frio em minha carne. 
Teus dentes, minha angústia. Possuía o tridente daquele deus azulado, escuro, medonho.
Não desejo invocá-lo. Petrificados em abismos marinhos ficavam peixes e lebres.
Teus dedos em meu cérebro, deslizavam como mil aranhas, punindo meus sonhos. Teus sonhos.
Meus dentes em teus olhos, convulsionados como luz de demônio velho: Não havia mais forma.


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