quinta-feira, 30 de julho de 2009

O Forasteiro

Luto tua causa
Homem de bem
Não sei de onde vens
Nem a cor de teus olhos

Sei que tens verde e vermelho na alma
Ruas e árvores em tua história
Cantos de terras distantes
e homens taciturnos

Mas também sei que és bravo e forte
Tens mente de marfim e cheiro de terra
Sei que sou apaixonada
Por tua fronte suada e longa
Por teu cheiro agressivo
E tuas barbas longas

Te sinto grande
Me sinto pequena
Não sei quem és
Mas posso te ouvir

Longe, mas posso

Não sei como
Mas teu cavalo faz poeira dançar no ar quando estás por vir
Eles dançam e cantam em teu nome

Sua risada é grande como suas botas
Seu hálito é quente
e nem posso sentí-lo

Tens meu coração
Sem ao menos eu o sabê-lo
caminhas há muito na minha retaguarda

Não sei quem és

Luto tua causa
Homem de bem
Não sei de onde vens
Nem a cor de teus olhos

Luto a tua causa

Homem de bem

Não sei de onde vens

Nem a cor de teus olhos.

La Musique de la Vie

Conheces a solidão?
Sabe-a forte e pungente como um pêndulo em teu peito de pássaro?
Sente-a como um martelo de grossa forja que te bate e abate?

Como um pequeno passarinho
Te mantém enredado na pior das prisões
Numa rede invisível e sensível
Dor, angústia e preces
É apenas o que te resta
Andarilho maltrapilho
e bêbado
Triste e cheio de passados...

Não sabes de nada, pequena criança
Pobre e sem lágrimas
Secas pela poeira do tempo não vivido

Não sintas, apenas siga
Tua sina de Ser
Tua angústia de existir
Sem viva alma ao teu lado

Sem música, sem vaias
Sem nada.

Se como um pavão te sentias
Hoje nada mais é além de espelhos...
Cristais e flautas
Mentiras de paixões e cantos
Olhos de castanha
Olhos frios

Amores de paradoxo
deixe-os para lá...
Eles também não mais fazem parte de tua solidão
Eles são apenas a puberdade da vida
E isso não é solidão

Enterre teus mortos
Liberte pardais
Viva o sol
E cante a noite

Não olhes
Não sejas
Não digas

O melhor é esquecer
Quando você já o foi antes...

Poeira e brisa

Carambolas e cães

Amêndoas e pimentas

Cheiros e corpos

Esqueça-os.

Até que o fim se instale como um parafuso em teu coração.

domingo, 26 de julho de 2009

1h 20min.

Tu simbolizas a mulher
Tu iluminas os vícios no sonho negro
Perfeita em tua sublime palidez
sedutora luz sai de ti
Saiba bela lua, quero ser tua aprendiz!
Me fecunde com sua arte
As estrelas te rendem prazeres
Oh, Bela lua, me carrega contigo!
Tu que estás neste céu marinho
Tu que abrigas os condenados
Neste suplício malsão te digo:
Oh, bela lua, me carrega contigo!
E tu que tendes a eterna compaixão
E de pocilgas e de vinhos sórdidos
Saiba bela, quero ser tua aprendiz!

(Poesias velhas, 2005)
Eles, os jograis na fria madrugada
com seus carrinhos de mão
levaram um pobre morto
Oh! Morte mambembe
Sangue de um povo amargo
eu, e eu, eu mesma
Eu Clara, na noite mórbida,
meu vestido acetinado branco,
minhas mãos cálidas se sujaram
com o sangue do povo, do único
Único Homem prestes a apodrecer!
Nas covas rasas, junto a milhares.


(Poesias velhas, 2005)

Incessante Som da Vida

Uma ave, um pôr do sol
Uma garota, olhos de caleidoscópio
incessante som de harpa
anjos surgem, harpistas incandescentes
uma gota qualquer, orvalho risonho
A tinta no papel, a vida no artista
o grito da descoberta, Deus no fim
Vontade intrínseca, amor surgindo
Pétalas brancas, pureza melancólica
ampla visão, encontro com pequenos seres
medalhas no peito, pegadas de sangue
Fonte de prazer, tensão da alma
Tudo é vaidade, Eclesiastes
Vida, perigo do Ser?

(Poesias velhas, 2005)

Bombons Doces

Formigas num imenso horizonte
Em busca de alimento
Talvez doce....

Eu não queria bombons amargos
Talvez eu também buscasse o doce
Amargo é o eterno recordar....

Em torno da luz
Prendem-se mosquitos
Em torno do mel
Agarram-se abelhas

Tão sutil é o toque de uma roupa...

Tão rara é a poesia
Tão presa, leve, intocada
Tão longe de minhas mãos
Vovó, porque não bombons doces?

(Poesias velhas, 2005)

Ciranda da Criação

A natureza criou a arte para alegrá-la
A arte prega boas peças à monotonia
A loucura nasce da arte latente
A loucura entorpece o demônio
O demônio nos atrai
A ignorância é com ele arrastada
E a grande eloquência é pega
Fabricando sua nova arte.


(Poesias velhas, 2005)